sexta-feira, 24 de abril de 2009

Ana


Ana saía todos os dias naquele mesmo horário para as aulas de piano. Era o momento mais tranquilo e sereno que conseguia ter em seu dia atribulado. Quando chegou ao saguão estranhou todo aquele silêncio, como uma escola de música poderia estar tão muda?! Havia somente ela, o piano, a escuridão no salão, e o silêncio. O piano estava a implorar por um som, e Ana como o entendia perfeitamente, sentou-se ao banquinho, estalou os dedos como de costume e pôs-se a tocar. Tocou uma valsa lenta, uma modinha, e até arriscou um clássico. Quando os seus dedos pararam de tocar as teclas, Ana as encarou e começou a vê-las de uma forma como nunca as tinha visto. Pensou em todas as pessoas que sentavam ali naquele mesmo banquinho, para tocar aquele mesmo piano, mas as melodias que entoavam não eram as mesmas, nem a forma como acariciavam as teclas. Pensando nisso veio a sua mente a ideia de que nada ali era mais o mesmo, como achara antes a olhos vistos. Não era o mesmo banquinho, nem o mesmo piano, nem a atmosfera era a mesma, pois haviam sido modificados por todos que ali estiveram. A partir do momento em que ela se sentou, estalou os dedos, tocou nas teclas do instrumento, e este por sua vez produziu sons tão distintos, modificou para sempre tudo naquele lugar, até a atmosfera que deixou de ser silenciosa e passou a ser sonora, nada permaneceu do mesmo modo, tudo mudava a cada instante, era um constante fluir.


na vitrola: 3namassa - na confraria das sedutoras